A importância de um contrato bem feito: o que perdemos quando o contrato não obedece a forma da lei?

Ademir de A. Mendonça Jr

A forma, muitas vezes, salva o conteúdo de um contrato

 
 

 

Quem já assinou um cheque sabe bem: as informações nele inscritas devem ser claras e exatas. Um dígito errado, uma rasura na data ou uma inconsistência na escrita do nome do beneficiário podem inutilizar o título e impedir a instituição financeira de recebê-lo. Quem inadvertidamente recebe um cheque defeituoso, se não tiver contato com o emitente (se, por exemplo, adquiriu por endosso ou simplesmente não conhece o devedor), será obrigado a acionar a justiça para que o juiz reconheça o crédito e promova a cobrança.

O cheque bem preenchido, por outro lado, permite ao credor um acesso muito mais ágil ao dinheiro: o banco é capaz de recebê-lo na data prevista e, quando não há fundos, ao credor é facultado o direito de acionar a justiça em uma ação de execução — que não precisa provar a existência do crédito em si, mas apenas promover a cobrança.

A forma do documento, nesses casos, tem função essencial no negócio. A padronização viabiliza a existência jurídica do cheque. Em outras palavras, é essa forma que torna o cheque um negócio imediatamente reconhecível pelo Direito.

Esse conceito não é exclusivo dos títulos de crédito. Todos os contratos guardam, em maior ou menor grau, a necessidade de uma formalidade mínima para se fazerem reconhecíveis. Reflita: quando duas pessoas fecham um negócio, apenas elas sabem do seu conteúdo. O aperto de mãos simboliza o nascimento da obrigação, mas, se nada mais for formalizado, os detalhes pactuados (preço, prazo, resultado desejado etc.) serão, para todos os efeitos, desconhecidos para quem não presenciou o fato. Como fazer com que outras pessoas (o juiz, por exemplo) entendam o que foi negociado?

A importância do contrato bem-feito: torná-lo compreensível para quem não participou da negociação

 

Contratos simples e instantâneos, como a venda de objetos de pouco valor ou os serviços de rápida execução, não exigem formalidades maiores do que o simples acordo verbal e o pagamento — ninguém assina folhas cheias de cláusulas contratuais no caixa do supermercado. No entanto, em contratos mais complexos ou de execução mais longa, a forma escrita ganha importância e, com ela, a forma se impõe como uma necessidade.

O assunto pode parecer banal ou já resolvido — afinal, há modelos para todo tipo de contrato disponíveis na internet. No entanto, uma folha com informações incompletas, genéricas ou dissociadas do negócio pouco contribuem para a identificação do negócio. Muitas vezes, apenas atrapalham.

No Brasil, é costumeiro assinar contratos indicando o nome de uma das partes com grafia incorreta ou com erros em dados que não foram corrigidos por serem “coisa pouca”, ou mesmo com cláusulas sem relação com o negócio, que permaneceram por ser parte de um modelo sempre utilizado por uma das partes.

Ocorre que o contrato feito apenas por formalidade, por minutas prontas, sem a inserção cuidadosa de dados e de cláusulas feitas sob medida para o que as partes estão combinando, faz com que a maior parte das informações relevantes da negociação permaneçam desconhecidas para quem não participou da contratação.

Enquanto as partes estão adimplentes e de acordo, essa divergência incomoda pouco e a preocupação com o assunto é até malvista — para o brasileiro, exigir um contrato bem escrito é tido como uma forma de desconfiança contra a honestidade alheia. No entanto, basta o primeiro atraso ou insatisfação para que as partes tirem o contrato da gaveta para ler as linhas, as entrelinhas e as letras miúdas.

Nesse ponto, se o contrato nasceu como mera formalidade, o prejuízo já aconteceu: para toda a coletividade, o que foi escrito no contrato é a verdade. Se há algo lançado no texto que não corresponde ao que as partes fazem na prática, será o contrato que definirá, até prova em contrário, o certo e o errado do negócio. Empréstimo (mútuo) ou parceria? Aluguel ou comodato? À vista ou parcelado? Com ou sem juros? É o texto do contrato que decide.

Isso não é tudo: quando o contrato precisa ser judicializado, cada dado ou cláusula que divirja da realidade precisará de uma produção de prova específica para que o juiz não tome o texto como a verdade. Nesses casos, em vez de acionar a justiça apenas para forçar o cumprimento do contrato, o credor precisará primeiro explicar o que é o seu contrato — discussão que, com um devedor negando na Justiça tudo o que conversou pessoalmente com o credor, fará o processo durar anos.

Requisitos mínimos de qualquer contrato escrito

 

Em negócios de grande valor ou mais complexos, uma boa assessoria é indispensável. Há, no entanto, cuidados que podem ser tomados por qualquer um e que evitam muitos problemas. Elencamos aqui alguns aspectos básicos que exigem atenção especial em todo tipo de contrato e que devem ser conferidos e ajustados sempre que não estiverem perfeitamente descritos:

  • Nome do negócio (compra e venda, locação, mútuo, etc.);
  •  Identificação das partes (nome, RG, CPF, profissão, endereço e estado civil, com indicação do regime de bens);
  • Identificação do objeto do contrato (descrição detalhada do bem ou do serviço contratado);
  • Preço;
  • Forma de pagamento;
  • Prazo de pagamento ou do cumprimento da obrigação (vencimento);
  • Consequências do descumprimento (rescisão, multa, devolução de valores, etc.);
  • Data de assinatura;
  • Assinatura de todos os envolvidos (inclusive testemunhas, se houver).

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